domingo, 5 de fevereiro de 2017

Alergia à proteína do leite de vaca x Intolerância à lactose x Galactossemia


Primeiramente, repitam comigo: NÃO EXISTE ALERGIA À LACTOSE, NÃO EXISTE ALERGIA À LACTOSE, NÃO EXISTE ALERGIA À LACTOSE. Agora voltemos à programação normal.

Por que repetir a frase acima? Porque é uma das principais dúvidas e dos principais problemas que acabamos enfrentando como pais de alérgicos. Ao se falar que a criança é alérgica a leite, a primeira coisa que as pessoas lembram é da lactose. Já passei por várias situações chatas em que os familiares ou amigos fazem ou compram algo sem lactose achando que seus filhos poderão comer e já escutei, inclusive de médicos, que era só tirar a lactose dos alimentos. 
A lactose, nada mais é do que o açúcar presente no leite e não causa alergia, mas sim uma intolerância em que a gravidade depende do organismo de cada pessoa. É causada pela diminuição ou ausência da lactase: enzima responsável pela digestão da lactose. Na intolerância, é possível que a pessoa ainda tolere pequenas quantidades, na alergia não. Na alergia não existe “só um pouquinho”. Um pedacinho ou o inteiro causa a mesma reação. Vamos falar um pouco sobre cada uma:


Alergia à proteína do leite de vaca
A alergia ao leite de vaca, também conhecida como APLV, é causada pela intolerância às PROTEÍNAS do leite. Ou seja, a alergia é das proteínas e não do açúcar, da lactose. A alergia é uma reação anormal do sistema imunológico às proteínas dos alimentos. Quanto ao leite de vaca, suas principais proteínas são: caseína, alfa-lactoalbumina e beta lactoglobulina. Aí vai um alerta na hora de ler os rótulos pois nem sempre o leite vem escrito conforme conhecemos mas sim com o nome das proteínas.
A alergia à proteína do leite de vaca é mais comum em bebês, pela imaturidade do sistema digestivo e bem rara em adultos. Alguns raríssimos casos chegam à vida adulta, geralmente quando não se fez a dieta restritiva adequada na infância. Pode ter alguns ou vários sintomas que variam de problemas de pele, respiratórios, intestinais, como: inchaço e/ou irritação nos lábios e olhos, urticária, dermatite atópica, coriza, vômitos e diarreias, cólicas intensas, fezes com sangue ou muco, assaduras persistentes, intestino preso, corte ou dermatite atrás da orelha (esse é um clássico), tosse, chiado no peito e dificuldade para respirar, irritabilidade, dificuldade em ganhar peso, anafilaxia e até um choque anafilático quando em sua forma mais grave. Podem ocorrer em minutos, horas ou dias após a ingestão de leite de vaca ou derivados, de forma persistente ou repetitiva.
O bebê amamentado pode apresentar alergia a algum alimento que sua mãe tenha consumido. Os mais comuns são: leite de vaca, ovo, soja, oleaginosas, peixes e frutos do mar em geral. Nesse caso, não basta apenas cortar o alimento da alimentação do bebê, mas também da mãe.
Não se deve atribuir qualquer problema do bebê à alergia. Para que se confirme uma provável alergia, é recomendado que retire o alimento tanto da alimentação da mãe (em caso de bebê amamentado) quanto do bebê por pelo menos 15 dias e observar se há melhora. Mais na frente veremos sobre como proceder com esses testes.
A boa notícia é que com uma dieta restritiva adequada, a APLV tem cura. Por volta dos 3 anos da criança, o sistema imunológico já está mais forte e é nessa fase que costuma-se ter relatos de cura. Algumas crianças se curam mais cedo, outras um pouquinho mais tarde, depende do organismo de cada uma, da dieta e da gravidade da alergia.


Intolerância à lactose
A intolerância à lactose é causada pela incapacidade de digerir a lactose, o açúcar do leite, devido à falta ou diminuição da lactase, enzima responsável por essa digestão. É mais comum do que a alergia e mais frequente em crianças maiores, já desmamadas, e adultos. Enquanto a alergia tem cura, após dieta restritiva e melhora do sistema imunológico da criança, por volta dos 3 anos, a intolerância à lactose não; e é extremamente comum. Raros somos nós, adultos, que podemos tomar leite, tranquilos, sem sentir nenhum tipo de desconforto.
Enquanto que a alergia tem sintomas variados, os sintomas da intolerância à lactose são intestinais, como cólicas, gases, diarreia, distenção abdominal, etc. Esses sintomas podem ocorrer em minutos ou horas após a ingestão do leite de vaca.
A lactose do leite materno não tem nada a ver com o leite de vaca, assim como não tem nada a ver com o fato da mãe tomar ou não leite. A lactose do leite de vaca não se absorve, para que se passe pelo leite materno. Ela é consumida, digerida e destruída. Ainda que a mãe tome litros de leite de vaca, em seu sangue, não há uma única molécula de lactose. E esse é o problema da lactose, ou se tem a lactase necessária para que essas moléculas sejam destruídas, ou não se tem e aí vem a intolerância, que causa problemas gástricos e intestinais, mas jamais se absorve e muito menos passa para o leite materno. Ela fica ali, em excesso no organismo, causando desconforto e os devidos problemas.
A lactose do leite materno é produzida no próprio seio e é produzida independente da mãe tomar ou não leite de vaca. Ou seja, é algo produzido pelo corpo humano e próprio para o bebê humano. É muito comum vermos médicos, enfermeiras e afins contraindicando o aleitamento materno alegando que a mãe passa lactose para o bebê causando alergia. CUIDADO! Muito se confunde alergia com intolerância e lactose do leite materno com lactose do leite de vaca. Em nenhum caso, mesmo de alergia alimentar, se contraindica a amamentação. Pelo contrário, além da lactose do leite materno ser benéfica para o bebê, o leite materno possui propriedades restauradoras que auxiliam na cura da alergia alimentar, melhora do sistema imunológico e cicatrização do intestino, que acaba ficando bem debilitado.
Existe uma raríssima intolerância primária à lactose, que é diferente da intolerância secundária, em que não se contraindica o leite materno. É a galactossemia.



Galactossemia
A galactossemia é uma grave enfermidade congênita que afeta 1 em cada 50.000 recém-nascidos. Não tem nada a ver com a intolerância secundária, que é comum e não contraindica a amamentação. Só falarei sobre a galactossemia para que não se confunda, pois é uma enfermidade raríssima e grave em que faz-se necessário a eliminação total de galactose e consequentemente lactose da dieta do bebê. 
O bebê com galactossemia não pode consumir galactose/lactose de origem animal, nem mesmo o leite materno. É um dos raros casos em que se contraindica a amamentação. A eliminação total da galactose/lactose deve ser mantida até pelo menos os 3 anos da criança e a partir daí, algumas toleram algumas pequenas quantidades.
É importante adotar a dieta adequada o mais rápido possível pois a galactossemia pode causar catarata, icterícia, retardo mental, cirrose, baixo ganho de peso, vômitos, hipoglicemia, entre outros. A boa notícia é que é possível saber sobre a doença assim que o bebê nasce pois é detectada no teste do pezinho. Ela não é adquirida, se deu negativo, a criança não tem.
Espero que tenha ficado claro a diferença dos três principais tipos de “intolerância”. Não se deixem confundir, pois como já foi falado, apenas a galactossemia é contraindicação para o leite materno e ela é detectada no teste do pezinho. E relembrando: não existe alergia à lactose!




Referências bibliográficas:

Tormo, R. Alergia e intolerância a la proteína de la leche de vaca (Protocolo de la Asociación Española de Pediatria).www.aeped.es/protocolos/gastroentero/1.pdfPumberger W, Pomberger G, Geisser W, Proctocolitis in breast fed infants: a contribution to differential diagnosis of haematochezia in early childhood. Postgrad Med J 2001; 77: 252-4http://pmj.bmjjournals.com/cgi/content/full/77/906/252Clyne PS, Kulczycki A. Human breast milk contains bovine IgG. Relationship to infant colic? Pediatrics 1991;87;439-444Iacono G, Cavataio F, Montalto G, Florena A, Tumminello M, Soresi M et al. Intolerance of cow´s milk and chronic constipation in children. N Engl J Med 1998;339: 1100-4 (Tradução de Fernanda Mainier)



Un regalo para toda la vida – Guia de lactancia materna, do Dr. Carlos González


http://www.alergiaaoleitedevaca.com.br

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